O professor Eduardo Fagnani, do Instituto de Economia da Unicamp, ao ver a manchete da primeira página da Folha (09/12/2013), ficou intrigad...
O professor Eduardo Fagnani, do Instituto de Economia da Unicamp, ao ver a manchete da primeira página da Folha (09/12/2013), ficou intrigado, resolveu pesquisar o assunto e constatou a manipulação da informação publicada pelo jornal.
Como transformar uma boa em uma má notícia? Creio que agora teremos uma aula de distorção e mau jornalismo. Um relatório do Banco Mundial sobre o SUS foi noticiado pelo jornal Folha de São Paulo com a seguinte manchete na primeira dobra da capa do diário:
Para o professor, a manchete não deixou margem à dúvida. A matéria destaca que essa é “uma das conclusões de relatório inédito obtido com exclusividade pela Folha”. Aos desavisados a mensagem subliminar é clara: o SUS é um fracasso e o Ministro da Saúde, incompetente.
Mas será mesmo? Veja o que Fagnani concluiu:
A curta matéria da suposta avaliação do Banco Mundial sobre vinte anos do SUS é atravessada de “informações” sobre desorganização crônica, financiamento insuficiente, deficiências estruturais, falta de racionalidade do gasto, baixa eficiência da rede hospitalar, subutilização de leitos e salas cirúrgicas, taxa média de ocupação reduzida, superlotação de hospitais de referência, internações que poderiam ser feitas em ambulatórios, falta de investimentos em capacitação, criação de protocolos e regulação de demanda, entre outras.
Desconfiado, ele fez o dever de casa, entrou no site do Banco Mundial e obteve acesso ao “inédito” documento “exclusivo”. Para seu espanto, consultando as conclusões da síntese (Overview), encontrou o seguinte texto (pág. 10):
Nesse caso, o órgão privilegia cinco pontos, a saber: ampliar o acesso aos cuidados de saúde; melhorar a eficiência e a qualidade dos serviços de saúde; redefinir os papéis e relações entre os diferentes níveis de governo; elevar o nível e a eficácia dos gastos do governo; e, melhorar os mecanismos de informações e monitoramento para o “apoio contínuo da reforma do sistema de saúde” brasileiro.
Ainda segundo Fagnani, O Banco Mundial tem razão sobre os desafios futuros, mas acrescenta pouco ao que os especialistas brasileiros têm dito nas últimas décadas. Não obstante, é paradoxal que esses pontos críticos ainda são, de fato, críticos, em grande medida, pela ferrenha oposição que o Banco Mundial sempre fez ao SUS, desde a sua criação em 1988: o sistema universal brasileiro estava na contramão do “Consenso de Washington” e do modelo dos “três pilares” recomendado pelo órgão aos países subdesenvolvidos. É preciso advertir aos leitores jovens que, desde o final dos anos de 1980, Banco Mundial sempre foi prejudicial à saúde brasileira.
É uma pena que o debate sobre temas nacionais relevantes – como o sistema público de saúde, por exemplo – seja interditado pela desinformação movida pelo antagonismo das posições políticas, muitas vezes travestido de ódio, que perpassa a sociedade, incluindo a mídia.
E o professor finaliza sua análise desejando melhorias no nível do debate no Brasil:
Penso que esse tipo de "ataque", ao meu ver, irresponsável, é do tipo que, por interesses obscuros, leva a uma baixa auto-estima do brasileiro, a não termos hoje, décadas de CIEPs com crianças carentes estudando em tempo integral (que podiam estar roubando, matando e pedindo, como de fato estão), e a termos melhores políticos que cada vez "jogam mais para a plateia" do que fazem reformas de base e estratégicas, como poderíamos citar: a reforma da previdência, tributária, política... Afinal, isso não vende jornal mas traz uma onerosa carga de custo político.
Todavia, esse tipo de reportagem desinformativa, só faz a alegria de quem já está contra-tudo-isso-que-está-aí (haters gonna hate). Todavia, em tempos de blogosfera, internet e mídias sociais, essas táticas só ajudam a caracterizar ainda mais a grande mídia como manipuladora. Ao passo que deveria tentar passar uma imagem de ser mais profissional, apuradora de fatos e imparcial (ainda que, em hipótese, seja mentira). Lembrando sempre que a geração nativa digital que está vindo aí tem um verdadeiro sexto sentido nato para a hipocrisia.
Para acessar o relatório 20 anos de reforma do sistema de saúde no Brasil - Uma avaliação do Sistema Único de Saúde (em inglês, PDF), clique AQUI.
Fontes: Folha de São Paulo, GGN, World Bank,
[Via BBA]
De onde foi que a Folha tirou isso? |
Ineficiência marca gestão do SUS, diz Banco Mundial.
Para o professor, a manchete não deixou margem à dúvida. A matéria destaca que essa é “uma das conclusões de relatório inédito obtido com exclusividade pela Folha”. Aos desavisados a mensagem subliminar é clara: o SUS é um fracasso e o Ministro da Saúde, incompetente.
Prof. Eduardo Fagnani |
A curta matéria da suposta avaliação do Banco Mundial sobre vinte anos do SUS é atravessada de “informações” sobre desorganização crônica, financiamento insuficiente, deficiências estruturais, falta de racionalidade do gasto, baixa eficiência da rede hospitalar, subutilização de leitos e salas cirúrgicas, taxa média de ocupação reduzida, superlotação de hospitais de referência, internações que poderiam ser feitas em ambulatórios, falta de investimentos em capacitação, criação de protocolos e regulação de demanda, entre outras.
Desconfiado, ele fez o dever de casa, entrou no site do Banco Mundial e obteve acesso ao “inédito” documento “exclusivo”. Para seu espanto, consultando as conclusões da síntese (Overview), encontrou o seguinte texto (pág. 10):
Nos últimos 20 anos, o Brasil tem visto melhorias impressionantes nos resultados da saúde, com reduções dramáticas na mortalidade infantil e aumento da expectativa de vida. Igualmente importante, as disparidades geográficas e socioeconômicas nos resultados tornaram-se muito menos pronunciadas. Há boas razões para acreditar que as mudanças no SUS têm desempenhado um papel importante. A rápida expansão da atenção básica contribuiu para mudanças nos padrões de utilização, com uma participação crescente de contatos que ocorrem em centros de saúde e outros serviços de cuidados primários. Houve também um crescimento global na utilização dos serviços de saúde e uma redução na proporção de famílias que relatam problemas no acesso a cuidados de saúde por razões financeiras. Em suma, as reformas do SUS têm alcançado pelo menos parcialmente as metas de acesso universal e equitativo aos cuidados de saúde.Em um primeiro momento, ele chegou a colocar em dúvida se havia lido o mesmo documento obtido pela jornalista. Após certificar-se, chegou à conclusão que sim. Constatado que estava no rumo certo, continuou a ler a avaliação do Banco Mundial e percebeu que as críticas apontadas eram “desafios a serem enfrentados no futuro”, visando o aperfeiçoamento do SUS.
Este relatório destaca cinco principais desafios que enfrentará o sistema de saúde do Brasil no futuro. (Tradução feita por Blog Brasil Acadêmico)
Nesse caso, o órgão privilegia cinco pontos, a saber: ampliar o acesso aos cuidados de saúde; melhorar a eficiência e a qualidade dos serviços de saúde; redefinir os papéis e relações entre os diferentes níveis de governo; elevar o nível e a eficácia dos gastos do governo; e, melhorar os mecanismos de informações e monitoramento para o “apoio contínuo da reforma do sistema de saúde” brasileiro.
Ainda segundo Fagnani, O Banco Mundial tem razão sobre os desafios futuros, mas acrescenta pouco ao que os especialistas brasileiros têm dito nas últimas décadas. Não obstante, é paradoxal que esses pontos críticos ainda são, de fato, críticos, em grande medida, pela ferrenha oposição que o Banco Mundial sempre fez ao SUS, desde a sua criação em 1988: o sistema universal brasileiro estava na contramão do “Consenso de Washington” e do modelo dos “três pilares” recomendado pelo órgão aos países subdesenvolvidos. É preciso advertir aos leitores jovens que, desde o final dos anos de 1980, Banco Mundial sempre foi prejudicial à saúde brasileira.
É uma pena que o debate sobre temas nacionais relevantes – como o sistema público de saúde, por exemplo – seja interditado pela desinformação movida pelo antagonismo das posições políticas, muitas vezes travestido de ódio, que perpassa a sociedade, incluindo a mídia.
E o professor finaliza sua análise desejando melhorias no nível do debate no Brasil:
Que o espírito reconciliador Mandela ilumine os brasileiros – e o pobre debate nacional.A matéria dentro do jornal traz um título um pouco (pouco) mais condizente, embora suprima totalmente a pare positiva do relatório:
Falta mais eficiência ao SUS do que verba, afirma estudoMas ainda mais curioso é que a ombudsman da Folha coloca uma pequena nota, intitulada "Só o negativo", no dia 15/12/2013, chamando a atenção para o tom pessimista da matéria:
A manchete de segunda-feira decretava: "Ineficiência marca gestão do SUS, diz Banco Mundial". A reportagem trazia apenas as críticas contidas no estudo, que fez um balanço de 20 anos do sistema único no país.
Toda a parte elogiosa, em que se ressalta, entre outros pontos, um acesso mais equânime à assistência médica, foi ignorada pelo jornal. Ficou a impressão de que o Banco Mundial condenava o SUS. Foi mais um ataque de pessimismo crônico da Folha.Ah! Então está explicado. Não foi plantada uma manchete distorcida para dar criar uma imagem de incompetência das autoridades porque o povo só lê a manchete da capa e (quase) nunca vai atrás das fontes para checar a veracidade da informação. É apenas um ataque de pessimismo crônico da Folha.
Para a ombudswoman: Apenas um ataque de pessimismo. |
Penso que esse tipo de "ataque", ao meu ver, irresponsável, é do tipo que, por interesses obscuros, leva a uma baixa auto-estima do brasileiro, a não termos hoje, décadas de CIEPs com crianças carentes estudando em tempo integral (que podiam estar roubando, matando e pedindo, como de fato estão), e a termos melhores políticos que cada vez "jogam mais para a plateia" do que fazem reformas de base e estratégicas, como poderíamos citar: a reforma da previdência, tributária, política... Afinal, isso não vende jornal mas traz uma onerosa carga de custo político.
Todavia, esse tipo de reportagem desinformativa, só faz a alegria de quem já está contra-tudo-isso-que-está-aí (haters gonna hate). Todavia, em tempos de blogosfera, internet e mídias sociais, essas táticas só ajudam a caracterizar ainda mais a grande mídia como manipuladora. Ao passo que deveria tentar passar uma imagem de ser mais profissional, apuradora de fatos e imparcial (ainda que, em hipótese, seja mentira). Lembrando sempre que a geração nativa digital que está vindo aí tem um verdadeiro sexto sentido nato para a hipocrisia.
Para acessar o relatório 20 anos de reforma do sistema de saúde no Brasil - Uma avaliação do Sistema Único de Saúde (em inglês, PDF), clique AQUI.
Fontes: Folha de São Paulo, GGN, World Bank,
[Via BBA]
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